Pular para o conteúdo principal

Álvares de Azevedo, Byron: cosmopolitismo e nacionalismo



Durante o romantismo realizado no Brasil, muitos poetas optavam por uma estética vinculada, aos dramas nacionais e alguns até acreditavam que para se consolidar a literatura brasileira era necessário tratar das paisagens locais. Ainda que Àlvares de Azevedo seja um poeta do período romântico da literatura brasileira, a temática de sua poesia não está vinculada àquela tentativa de desprendimento da literatura européia e de dar forma a uma identidade nacional, algo que aconteceu com os escritores categorizados como de primeira geração.
 Ao avaliar o opúsculo de Gonçalves de Magalhaens, no momento em que o autor fala Sobre a História da Literatura no Brasil fica evidente seu caráter de manifesto, ou melhor, o autor dá exemplos literários e históricos destinados a um fim, ou seja, o autor evidencia certo instinto oculto, que pensava ser necessário para a formação de uma literatura nacional. Para Gonçalves de Magalhaens, a paisagem brasileira seria a matéria de poesia necessária para despertar o espírito de uma literatura independente. No entanto, utilizando aqui o mesmo pensamento de Machado de Assis em o Instinto de Nacionalidade, obras como as de Byron e de Goethe, não deixaram de ser valiosas para suas respectivas nações só porque trataram de outras paisagens que não inglesa ou alemã.
Ainda sobre o ponto de vista nacionalista e partindo para um campo politico e filosófico, Martha Nussbaum em For love of Country faz uma dura crítica a respeito de um nacionalismo exacerbado, que substituí valores universais como a justiça e os direitos humanos por valores ligados a um ídolo colorido. o Ensaio de Nussbaum que foi realizado em 1994 e que ganha nova forma após os atentados de 11 de setembro, dá ênfase a uma politica do cosmopolitismo. Já o filosofo Appiah a partir de sua tradição familiar ressalta a necessidade de um patriotismo cosmopolita. Nesse sentindo, ao trazer os conceitos de nacionalismo e cosmopolitismo para o campo literário é nítido observar que autores como Byron e Álvares de Azevedo não detinham em suas obras preocupações nacionalistas e cosmopolitas. Apesar disso, é notável que Byron em seu modo de viver e em sua obra constrói uma personagem desgarrada de sua pátria/Albion,

Adeus ó terras da pátria,/que oculta o ceruleo mar,/Bramão os ventos e as vagas,/Oiço o alcião grasnar: Aquele sol que declina, Nós vamos acompanhando, Não só a ti, mas a ele, Feliz noite desejando. (1863:16)

A voz irônica do peregrino Childe Harold, demostra seu sentimento de exilio diante de uma pátria que não mais poderia o satisfazer. Também é notável, que Àlvares de Azevedo, leitor feroz da literatura europeia, utiliza-se de referências como Byron, Vitor Hugo, Shakespeare, Goethe e Musset, um exemplo disso é sua obra Lira dos vinte anos e o poema O Conde Lopo. Alem disso é possível identificar que Álvares fala da paisagem brasileira, como no poema Na minha terra, pois as palavras pinheiro, mangueira, rancho, viola, serra e laranjeira são típicas do Brasil, entretanto o autor cita também a Itália, portanto se esclarece que a terra desse eu lírico é uma terra que vai além das origens do autor, e está mais ligada à terra de ares góticos, melancólicos, imaginados e inscritos nas obras europeias.

Minha terra sombria és sempre bela,/Inda pálida vida a vida,/ Como o sono inocente da donzela, /No deserto dormida! (1996:16)

A meu ver, não há erro em ser patriota como Whitman cantando a América, Fernando Pessoa cantando a Portugal. O problema se dá, quando se passa por cima de tantos outros valores em nome de uma pátria. Portanto, creio que a poética de Lord Byron e de Álvares não possui uma preocupação direta em ser nacionalista e nem de ser cosmopolita. Contudo é inegável que ainda que o jovem Álvares não tenha viajado fisicamente à Europa, sua literatura revela um enorme conhecimento da cultura europeia e um manejo peculiar com as letras brasileiras. Assim tanto Byron, o romântico Inglês de uma personalidade excêntrica, quanto Álvares de Azevedo são cosmopolitas no sentindo de serem escritores, que de modos diferentes tiveram contato com culturas diversas que não a suas e que trataram de temáticas vinculadas ao amor, ao desejo, as traições, as ambições e as ânsias dos sujeitos errantes, temas esses que são universais.

Referências

APPIAH, Kwame Anthony. Patriotas cosmopolitas. Revista Brasileira de Ciências Sociais vol. 13 n. 36. São Paulo: Anpocs, 1998.
ASSIS, Machado de. Instinto de Nacionalidade. Publicado originalmente em O Novo Mundo 1873, Nova Aguiar, vol. III. Rio de Janeiro: 1994.
AZEVEDO, Álvares de. Lira dos Vinte Anos. São Paulo: Martins Fontes, 1996. Coleção (Poetas do Brasil)/ Acessado em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000021.pdf
MAGALHAENS, D. J. Gonçalves de. Opusculos: Historicos e Literarios. Rio de Janeiro: Livraria de B. L. Garnier,1865.

NUSSBAUM, Martha C. Patriotism and Cosmopolitanism. In: M. C. Nussbaum et al. For Love of Country? Boston: Beacon, 1996, reed. 2002; Patriotismo y cosmopolitismo. In: M. C. Nussbaum et al. Los límites del patriotismo. Barcelona: Paidós, 1999.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

 No delírio da tarde  Eu vi meu rosto.  Na taça emborcada do dia sorvido  Eu vi meu rosto. O cristal se partiu,  Esgotei meus olhos na noite.  Maria Angela Alvim Livro "Superfície" 1950, em Poemas 

A senhora que ali estava/ conto

Pela manhã, Ina resolveu conhecer um novo lugar, estava cansada. Não os pais, não o marido, não as pessoas compreendiam. Então por uma semana passou em uma nova cidade e, todos os dias de manhã caminhava por algumas ruas, achava aquele lugar de aparência agradável. Já que estava passando muito mal mesmo, e as pessoas não poderiam imaginar – resolveu caminhar. Viu uma senhora sentada num banco e pensou em conversar com ela para ver se o tempo passava e aqueles sentimentos de tristeza e insatisfação passassem junto. A senhora prontamente lhe deu bom dia e disse que esperava por coincidência que alguém sentasse ali e falasse com ela também. Perguntou seu nome e ambas disseram uma à outra seus respectivos nomes. O sol pela manhã como de costume naquele lugar estava ameno. Ina percebeu no modo de ser daquela senhora certa avidez para lhe contar algo sobre ela mesma. Achou que deveria perguntar o que ela queria dizer. A senhora lhe disse: ___ A vida é muito difícil, possui nuances de possibi...

tensão,ovo novelo e plano-piloto para a poesia concreta

O plano-piloto para a poesia concreta publicado em 1958, em noigandres, se realizou na tentativa de esclarecer as intenções dessa nova abordagem poética, que não se interessava pela estrutura linear e discursiva do verso. A proposta dos irmãos Campos e de Décio Pignatari sobre a poesia concreta não era, a meu ver, de uma ruptura com o passado, mas sim de uma evolução das formas poéticas antes utilizadas. Essa teoria se coloca como linha de frente para a poética voltada para além dos recursos verbais.  Os recursos espaciais, como também os sonoros ganham grande importância na construção do sentido. Muitos são os poemas publicados por Augusto de Campos que se relacionam com as ideias presentes no plano-piloto. No entanto, neste trabalho será tratado apenas dois poemas, como “Tensão” e “Ovo novelo”. No poema “Tensão”, é possível perceber a comunicação entre a linguagem verbal, visual e também sonora. com           ...