quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Friedrich Nietzche

A mulher completa incorre em literatura como incorre num pecadilho: como experiência, de passagem, olhando em volta para ver se alguém a está notando, que alguém a está notando...

 (Crepúsculo dos Ídolos: Tradução de Paulo César de Souza)

Mulher Adomercida

Moro no ventre da noite:
sou a jamais nascida.
E a cada instante aguardo vida.

As estrelas, mais o negrume
são minhas faixas tutelares
e as areias e o sal dos mares.

Ser tão completa e estar tão longe!
Sem nome e sem família cresço,
e sem rosto me reconheço.

Profunda é a noite onde moro.
Dá no que tanto se procura.
Mas imtransitável, e escura.

Estareium tempo divino
como árvore em quieta semente,
dobrada na noite, e dormente.

Até que de algum lado venha
a anunciação do meu segredo
desentranhar-me deste enredo,

arrancar-me à vaguesa imensa,
consolar-me deste abandono,
mudar-me a posição do sono.

Ah, causador dos meus olhos,
que paisagem cria ou pensa
para mim, a noite é densa?

Cecília Meireles ( Livro Mar Absoluto)

As ilhas Afortunadas

Que voz vem no som das ondas
Que não é a voz do mar?
É a voz de alguém que nos fala,
Mas que, se escutamos, cala,
Por ter havido escutar.

E só se, meio dormindo,
Sem saber de ouvir ouvimos,
Que ela nos diz a esperança
A que, como uma criança 
Dormente, a dormir sorrimos.

São ilhas afortunadas,
são terras sem ter lugar,
Onde o Rei mora esperando.
Mas, se  vamos despertando,
Cala a voz, e há só mar.

Fernando Pessoa (Livro Mensagem)