Após sistematizar nas duas primeiras críticas o funcionamento da razão através da filosofia da natureza, onde seus conceitos estão fundamentados na legislação do entendimento e, por outro lado, da filosofia moral, onde sua própria legislação se funda na razão, Immanuel Kant na Crítica da Faculdade de Julgar [Kritik der Urteilskraft] descreve o funcionamento desta faculdade que a partir de um próprio princípio é capaz de fazer a conexão entre os dois domínios que constitui o saber humano. A faculdade de julgar enquanto mediadora entre a razão e o entendimento não engendra uma lei por si, mas subsume o “particular da natureza ao universal”. Desse modo o ajuizamento do belo é representado a partir de um princípio subjetivo a priori e não advém do entendimento, uma vez que, enquanto juízo da percepção, sua representação não gera conhecimento. Embora o princípio seja transcendental, o sentimento de prazer na contemplação, livre e desinteressada do objeto belo apraz a posteriori.
Friedrich Schiller que também se debruçou nos objetos da filosofia estética, reconhece o mérito do trabalho de Kant que fornece os fundamentos da mesma.
Além disso, o filósofo alemão em sua "Analítica da faculdade de julgar" expõe quatro definições ou momentos do juízo do gosto:
Gosto é a faculdade de julgamento de um objeto ou modo de representação através de uma satisfação ou insatisfação, sem qualquer interesse. O objeto de tal satisfação se denomina belo.
O belo é aquilo que apraz universalmente sem conceito.
Beleza é a forma da finalidade de um objeto, na medida em que é percebida nele sem a representação de um fim.
Belo é aquilo que se conhece, sem conceitos, como efeito de uma satisfação necessária.
No primeiro momento da definição, Kant mostra como o belo, que não é teleológico, diferencia-se do bom e do agradável, na medida em que o primeiro possui um fim em si mesmo e o segundo quer fruir e depende da sensação. Por isso o belo apraz desinteressadamente e é reflexionante. No segundo momento, temos a descrição do juízo de gosto como um juízo estético que não se funda em conceitos e sim na percepção e que procura o assentimento universal tal como no sublime. Pois como Kant explica: “[...] os juízos "o homem é belo" e “o homem é grande" não se limitam apenas ao sujeito que julga, mas, como juízos teóricos, exigem assentimento de todos. (2018, p. 249)”.
A terceira definição expõe como a representação do objeto belo, é conforme a fins, por isso ele se reflete no jogo como uma forma finalizada. O exemplo disto está no desenho e nas “Belas Artes”, pois nestas o essencial é o desenho, por isso o belo, não contenta na sensação, mas “apraz na sua forma”. Portanto, não é possível na contemplação encontrar uma causa, já que o objeto dito belo ou o estado mental é finalizado como se houvesse um conceito, mas não se pretende um fim.
Schiller nos mostra que o belo da natureza está na conformidade à arte. Para ele o conceito fundamental universal da beleza não é a conformidade a fins como investiga Kant, mas a liberdade: "A conformidade à arte serve apenas para tornar visível a liberdade também em objetos naturais que devem ser ajuízados como belos: a lembrança de uma regra deve meramente nos fazer notar a independência de um objeto das mesma." (p. 66)
"Toda formação (Bildung) ou forma consiste na limitação e é, pois, de certo modo, uma restrição surgida ou por uma regra ou pelo acaso. Em todos os produtos da natureza que se referem a uma técnica encontramos a dependência recíproca das partes em sua disposição mútua. Beleza, porém, é liberdade no constrangimento, natureza na conformidade à arte; ela está presa apenas à intuição imediata; a beleza natural não se funda sobre um conceito; a técnica de um produto natural recai imediatamente sobre os olhos." P. 67
Assim, também o filósofo alemão distingue neste momento o juízo moral do juízo estético, se aquele é prático, este é no ajuizamento do belo contemplativo. No quarto momento, reforça-se o argumento de que o juízo estético não é apodítico, sua necessidade não se origina em conceitos, mas na pretensão a comunicabilidade universal, do comum assentimento, no dever da concordância.
Assim também explica em sua crítica como a satisfação com o belo não depende de uma sensação. O sentimento de prazer despertado pelo objeto belo consiste no relacionamento do livre jogo entre a imaginação e o entendimento que realiza o “[...] acordo com os seus conceitos em geral (sem determinação dos mesmos)”. (2018, p. 152). Se ao julgar um objeto belo a mente contempla tranquila no jogo harmônico entre imaginação e entendimento, no ajuizamento do sublime a mente se encontra em conflito, por "inadequação da imaginação na destinação estética da grandeza":
[Sobre o sublime] O juízo mesmo, porém, segue a ser estético, já que, sem ter por fundamento um conceito determinado do objeto, apenas apresenta o jogo subjetivo das faculdades mentais (imaginação e razão), mesmo em seu contraste, como harmônico. Pois assim como a imaginação e o entendimento produziam no entendimento no julgamento do belo, por sua unanimidade, uma finalidade subjetiva das faculdades mentais, assim também a imaginação e a razão a produzem aqui por seu conflito. (2018, p. 155)
Schiller ao tratar do belo observa como é na reciprocidade entre o impulso sensível (vida) e o formal (forma) que se realiza a consumação do belo, isto é, o impulso lúdico, pois é no jogo em que sensibilidade e objetividade se suprimem mutuamente. Neste caso, a beleza é objeto comum a ambos os impulsos. Por isto, Schiller chama este jogo não de limitação mas de ampliação. A beleza, assim é o estado mediador que liga matéria e forma.
A objetividade que trata Schiller à elaboração de um juízo do gosto reside também no fato pelo qual "o homem tem de tornar em lei a comunicabilidade universal de suas sensações" (p. 34) Assim ele mostra que o juízo do gosto compraz sem uma finalidade tanto como o juízo moral. Ambos os juízos se dão de forma semelhante no que concerne à forma e imediatez, pois :
" o gosto possui, como razão prática, um princípio interno de ajuizamento, une ambas as naturezas do homem e facilita-lhe a transição à eticidade, pois assim ele afirma uma certa liberdade nas coisas sensíveis e imprime só seu tratamento o caráter da universalidade e necessidade." P. 35
Como nota Schiller o gosto é a faculdade capaz de "referir uma representação sensível a algo suprasensível" , faculdade que "conduz do mundo sensível ao mundo inteligível" e se fundamenta tanto na capacidade receptiva das impressões quanto na capacidade "autoativa" da imaginação e do entendimento. Mas não é apenas no jogo entre essas duas faculdades que que o belo é determinado, mas também.na própria razão ...
"Ela recebe sua existência na natureza sensível e obtém seu direito de cidadania no mundo da razão" p.
"O gosto unifica as faculdades superiores e inferiores do ânimo; ele chama a razão filosofante de volta das reflexões à intuição; ele oferece humanidade." P. 38
Talvez não seria um equívoco a partir das distinções de Schiller entre o homem selvagem, bárbaro avaliar como o gosto se dá no homem cultivado, na medida em que nele há a hamonização…
"Belo é um produto da natureza que aparece livremente em sua conformidade a arte" …
Schiller neste ponto pode estar tratando do mesmo sentido de Kant...ao julgarmos algo da natureza belo é como se pudéssemos vislumbrar uma regra nela..uma técnica ...como se houvesse uma técnica, como.se.finalizada...não sabemos se há nela inteligência, mas vislumbramos uma organização..assim o belo se.mostra na singularidade de sua organização….***
Kant " É preciso observar ainda que, embora a satisfação com o belo, assim como a satisfação com o sublime, não apenas se diferenciem dos demais julgamentos estéticos pela comunicabilidade universal, mas obtenham ainda, graças a está propriedade, um interesse em relação à sociedade (na qual são comunicadas), também a ruptura com a sociedade pode ser considerada algo sublime quando se baseia em ideias que desconsideram qualquer interesse sensível. Bastar-se a si mesmo, portanto não precisar da sociedade, sem ser contudo insociável, isto é, fugir da sociedade, é algo que se aproxima do sublime. (2018, p. 173)
Dedução somente sobre o belo da natureza ...
“O juízo de gosto determina seu objeto, no que diz respeito à satisfação (como beleza), com uma pretensão ao assentimento de todos, como se fosse objetivo.” P. 179
Ex. “essa flor é bela”
O juízo do gosto tem pretensão à autonomia
Daí que um jovem poeta não se deixe dissuadir da convicção de que seu poema é belo pelo juízo do público ou de seus amigos; e se ele lhes da ouvidos, não o faz porque mudou de opinião, mas por encontrar em seu anseio por aprovação um motivo para acomodar-se na ilusão comum – mesmo que todo o público tivesse mau gosto (ao menos do seu ponto de vista). Somente mais tarde, quando o exercício de sua faculdade de julgar a tiver tornado mais acurada, poderá ele afastar-se livremente de seus juízos antigos; tal como ele faz também com os seus juízos que se baseiam inteiramente na razão. O gosto só tem pretensão à autonomia. Fazer de juízos alheios o fundamento de determinação do próprio juízo será heteronomia. (2018, p.180)
Kant
“Que obras dos antigos sejam, com razão, tomadas como modelos, e o seus autores sejam denominados clássicos, como se fossem os nobres dentre os escritores, ditando leis ao povo através de seu exemplo, é algo que parece sugerir fontes a posteriori do gosto e refutar a sua autonomia em cada sujeito.”
“Mas, dentre todas as faculdades e talentos, o gosto é justamente aquela que, por seu juízo não ser determinável por conceitos ou preceitos, mais necessita dos exemplos daquilo que, no decorrer da cultura, contou por mais tempo com assentimento - para não recair logo na falta de cultura e na crueza das primeiras tentativas.” (2018, p. 181)
“O juízo de gosto não pode ser determinado por argumentos, exatamente como se fosse meramente subjetivo.” P. 181
Não há, portanto, nenhuma demonstração empírica capaz de coagir o juízo de gosto alheio. p. 182
§34
“Sob um princípio do gosto se poderia entender um princípio sob cuja condição fosse subsumido o conceito de um objeto e, por uma conclusão, se deduzisse então que ele é belo. Mas isso é absolutamente impossível. Pois eu tenho de sentir prazer imediatamente na representação desse objeto, e ele não pode ser-me imposto por nenhum tipo de demonstração.” P. 183***mas sim por reflexão
“A própria crítica do gosto, portanto, é apenas subjetiva no que diz respeito à representação pela qual um objeto nos é dado, ou seja, ela é a arte ou ciência de colocar sob regras a relação recíproca de entendimento e imaginação na representação dada (sem referência à sensação ou conceito precedente) e, portanto, a harmonia ou desarmonia entre elas, bem como de determiná-la quanto às suas condições.” P. 183
“Agora, como o juízo não tem aqui por fundamento um conceito do objeto, ele só pode consistir na subsunção da própria imaginação (em uma representação pela qual um objeto é dado) sob a condição de que o entendimento em geral avance da intuição aos conceitos. Ou seja, como a liberdade da imaginação reside justamente no fato de ela esquematizar sem 184 conceitos, o juízo de gosto se baseia então em uma mera sensação da animação recíproca entre a imaginação em sua liberdade e o entendimento com sua legalidade; ele se baseia, portanto, em um sentimento que permite julgar o objeto segundo a finalidade da representação (pela qual um objeto é dado), fomentando assim o livre jogo da faculdade de conhecimento; e o gosto, como faculdade de julgar subjetiva, contém um princípio da subsunção - mas não das intuições sob conceitos, e sim da faculdade de intuir ou representar (isto é, a imaginação) sob a faculdade dos conceitos (isto é, o entendimento), na medida em que a primeira, em sua liberdade, concorda com o último em sua legalidade.” P. 185
Juízo formal de reflexão*juízo estético
[...] mas um juízo formal de reflexão que supõe essa satisfação como necessária em todos, ele 185 precisa ter algo como princípio a priori por fundamento que, embora possa ser meramente subjetivo (caso um princípio objetivo seja impossível para tal tipo de juízo), carece ainda assim de uma dedução, pela qual se compreenda como um juízo estético pode ter pretensão à necessidade. P. 186
Um problema que, portanto, diz respeito aos princípios a priori da faculdade de julgar pura nos juízos estéticos, isto é, naqueles em que ela não precisa (como nos teóricos) apenas subsumir sob conceitos objetivos do entendimento e não está sob uma lei, mas é antes ela própria, subjetivamente, tanto o objeto como a lei.
Juízo do gosto é sintético
“Por isso todos os juízos de gosto são também juízos singulares, já que não ligam o seu predicado da satisfação a um conceito, mas sim a uma representação empírica singular dada.” P. 187
Embora o prazer com o sublime da natureza, como prazer de uma contemplação pensante, também levante uma pretensão ao compartilhamento universal, ele já pressupõe um outro sentimento, qual seja, o de sua determinação suprassensível - que, por mais obscuro que seja, possui uma base moral. P. 189
§ 39 resumo
Em contrapartida, o prazer com o belo não é nem um prazer da fruição nem uma atividade de base legal, nem tampouco um prazer da contemplação pensante a partir das ideias, mas sim um prazer da mera reflexão. Sem ter um fim ou princípio como padrão de medida, esse prazer é acompanhado pela apreensão comum de um objeto pela imaginação, como faculdade da intuição, em relação com o entendimento, como faculdade dos conceitos, e através de um procedimento da faculdade de julgar que ela também tem de executar em favor da experiência mais comum; com a diferença de que, enquanto aqui ela é forçada a fazê-lo com o objetivo de perceber um conceito empírico objetivo, lá (no julgamento estético) ela o é para meramente perceber a adequação da representação à atividade harmônica (subjetivamente conforme a fins) de ambas as faculdades de conhecimento em sua liberdade, isto é, para sentir o estado do representar com prazer. Este prazer tem de estar necessariamente baseado, em cada um de nós, nas mesmas condições, já que são condições subjetivas da possibilidade de um conhecimento em geral, e a proporção dessas faculdades de conhecimento, / / que é requerida para o gosto, também é requerida do entendimento saudável e comum que se pode pressupor em todos. Justamente por isso, aquele que julga com gosto (se não está errado nessa consciência e não toma a matéria pela forma ou o atrativo pela beleza) também pode esperar de todos os demais a finalidade subjetiva, isto é, a sua satisfação com o objeto, e considerar o sentimento universalmente comunicável, e aliás sem a mediação de conceitos. P. 190
Poder-se-ia até definir o gosto [sensus communis aestheticus] como a faculdade de julgamento daquilo que torna o nosso sentimento por uma dada representação universalmente comunicável sem a mediação de um conceito. P. 193
Empiricamente, o belo só interessa na sociedade; e, caso se admita o impulso à sociedade como natural ao ser humano, e a aptidão e a tendência para tal, isto é, a sociabilidade, como exigência 297 para o ser humano enquanto criatura destinada à sociedade, / / portanto como propriedade pertencente à humanidade, então não se pode deixar de considerar também o gosto como uma faculdade de julgamento de tudo aquilo que permite comunicar até mesmo o próprio sentimento a todos os demais, portanto como meio de fomentar aquilo que é requerido de cada pessoa por uma inclinação natural.
Kant não reduz o gosto a empiria, importa a relação a priori do juízo do gosto
Agora, admito de bom grado que o interesse pelo belo da arte (no qual incluo também o uso artificial das belezas naturais para a ornamentação, portanto para a vaidade) não fornece prova alguma de um modo de pensar atrelado ao moralmente bom, ou mesmo somente inclinado a este. Em contrapartida, porém, afirmo que tomar um interesse imediato pela beleza da natureza (não apenas ter gosto para julgá-la) é sempre uma marca característica de uma boa 299 alma; / / e que, se esse interesse é habitual, ele indica ao menos uma disposição de ânimo favorável ao sentimento moral quando se , liga de bom grado à contemplação da natureza. E preciso lembrar bem, contudo, que aqui me refiro apenas às formas belas da natureza, ao passo que os atrativos, por mais que ela costume ligá-los tão ricamente àquelas, continuo deixando de lado, pois, ainda que o interesse por eles também seja imediato, é todavia empírico. P. 196
A associação com o bem moral..está apenas na relação com o belo da natureza
Essa primazia da beleza natural frente à artística (em que pese esta superar aquela no que diz respeito à forma), essa capacidade de despertar por si só um interesse imediato, concorda com o modo de pensar apurado e rigoroso que é próprio a todos os seres humanos que cultivaram o seu sentimento moral. Se um homem que tem suficiente gosto para julgar produtos da bela arte com a maior correção e refinamento / / abandona de bom grado o ambiente em que se podem encontrar aquelas belezas que entretêm a vaidade e as alegrias da sociabilidade, (2018, p. 197)
Interesse imediato somente pelo belo da natureza
Também é fácil explicar por que a satisfação com a bela arte no juízo puro de gosto não se liga a um interesse imediato do mesmo modo como no caso da bela natureza. Pois aquela é ou uma imitação desta última que chega a enganar - e então ela produz o seu efeito como se fosse (tomada por) uma beleza natural -, ou uma arte visivelmente direcionada, de maneira intencional, à nossa satisfação; neste último caso, porém, a satisfação com esse produto, ainda que tenha lugar imediatamente, por meio do gosto, produziria um interesse apenas mediato na causa em que está fundada, a saber, uma arte que só pode interessar por seus fins, jamais em si mesma. P. 199
A arte se distingue da natureza do mesmo modo como o fazer (facere) se distingue do agir ou efetuar em geral (agere), e o produto ou consequência da primeira, como obra (opus), se distingue do último enquanto efeito (effectus). (p. 200)
Do ponto de vista do direito, somente se deveria chamar de arte a produção de algo por meio da liberdade, isto é, por meio de um arbítrio que toma a razão por fundamento de suas ações. P. 201
“E aconselhável lembrar, porém, que em todas as artes liberais é requerido algo de coercitivo, ou, como é chamado, um mecanismo sem o qual o espírito, que tem de ser livre na arte e é o único a dar-lhe vida, não teria um corpo e evaporaria por completo (na arte poética, por exemplo, a correção e a riqueza linguísticas, bem como a prosódia e a métrica); afinal, há muitos educadores novos que acreditam fomentar da melhor maneira uma arte liberal quando a libertam de toda coerção e transformam o trabalho em mero jogo.” P. 202
Se a arte, adequada ao conhecimento de um objeto possível, direciona as ações para tal requeridas somente para torná-lo real, ela se chama mecânica; se, em contrapartida, tem o sentimento de prazer como seu propósito imediato, ela se chama estética. Esta última é uma arte que é ou agradável ou bela. Ela é do primeiro tipo quando tem por fim que o prazer acompanhe as representações como meras sensações; e é do segundo tipo quando tem por fim que ele as acompanhe como modos de conhecimento. P. 203
Em contrapartida, as belas artes são um modo de representação que é por si mesmo conforme a fins e, embora sem fim, // fomentam 306 o cultivo das forças da mente para a comunicação em sociedade. P. 203
“[...] a arte estética, enquanto bela arte, é tal que seu padrão de medida está na faculdade de julgar reflexionante, e nao na sensação dos sentidos.” P. 203
Em um produto das belas artes é preciso ter consciência de que se trata de arte, e não de natureza; entretanto, a finalidade na sua forma tem de parecer tão livre de qualquer coerção de regras , arbitrárias como se ele fosse um produto da mera natureza. E nesse sentimento da liberdade no jogo de nossas faculdades de conhecimento - o qual, todavia, tem de ser ao mesmo tempo conforme a fins - que se baseia aquele único prazer que é universalmente comunicável sem fundar-se em conceitos. A natureza só era bela quando ao mesmo tempo parecia ser arte; e a arte só pode ser denominada bela quando temos consciência de ser ela arte, parecendo ao mesmo tempo natureza. P. 204
Assim, mesmo que seja intencional, / / a finalidade nos produtos das belas artes tem de parecer não intencional; ou seja, a bela arte tem de ser considerada como natureza, ainda que, evidentemente, se tenha consciência de que ela é arte. Mas um produto da arte parece natureza na medida em que encontramos a maior precisão na concordância com as regras segundo as quais o produto pode tornar-se o que deve ser; mas sem que se sinta qualquer incômodo com isso, sem que se perceba a forma escolar, isto é, sem 204 que se veja qualquer traço de que a regra esteve diante dos olhos do artista, impondo amarras às suas forças mentais. P. 204
Belas artes, produto de gênio
“Que ele mesmo não pode descrever ou indicar cientificamente como cria o seu produto, a não ser dizendo que lhe dá a regra enquanto natureza;” p. 206
(Daí que a palavra "gênio" venha presumivelmente de genius, o espírito protetor e condutor que é dado a um homem no seu nascimento, como sua propriedade, e que fornece a inspiração da qual emanam aquelas ideias.) 4) Que a natureza, através do gênio, não dá a regra à ciência, mas sim à arte; e, mesmo assim, somente quando se trata da bela arte. P. 206
Gênio oposto ao espírito da imitação*originalidade
Por mas técnica que se tenha, “[...] não se pode aprender a escrever poesia de maneira brilhante,”
[...] ao passo que nenhum Homero ou Wieland poderia indicar como surgiram e se juntaram em seus cérebros as suas ideias, ao mesmo tempo ricas em fantasia e intelectualmente profícuas, porque nenhum deles saberia dizê-lo a si mesmo, muito menos ensiná-lo aos demais. P. 207
De acordo com Kant as belas artes são obras de gênio e dependem do talento ..poetas são gênios ...cientistas para ele não...pois estes fazem a demonstração...expõem seu método... o que Kant diria de poetas como Poe? Na filosofia da composição, onde o poeta expõe seu método... ao contemplar a arte bela se abstrair da técnica, de seu mecanismo de composição...
Ainda que, de fato, a arte mecânica e as belas artes - a primeira como mera arte do esforço e do aprendizado, as últimas como artes do gênio - sejam muito distintas entre si, não há nenhuma bela arte cuja condição essencial não seja constituída por algo de mecânico, que pode ser compreendido e seguido de acordo com regras, e, portanto, algo de escolar. Pois algo tem de ser aí pensado como fim, do contrário não se poderia atribuir o seu produto a arte alguma - ele seria um mero produto do acaso. Para colocar um fim em ação, porém, são requeridas determinadas regras das quais não podemos nos liberar.
Kant observa que na obra de gênio o mecanismo não é exposto, mas isso não significa que não há técnica
“Para o julgamento de objetos belos enquanto tais é exigido o gosto; mas, para as próprias belas artes, isto é, para a produção de tais objetos, é exigido o gênio.” P. 208
Uma beleza natural é uma coisa bela; a beleza artística é uma representação bela de uma coisa. (p. 209)
[...] ser declarado belo, então, uma vez que a arte sempre pressupõe um fim na causa (e sua causalidade), tem de ser posto, como fundamento, um conceito do que a coisa deve ser; e, na medida em que a perfeição da coisa é a concordância do diverso nela com a sua determinação interna como fim, é preciso que, no julgamento da beleza artística, a perfeição da coisa seja levada ao mesmo tempo em conta - algo que absolutamente não está em questão no julgamento de uma beleza natural (enquanto tal). (2018, p. 209)
“Chega de falar sobre a representação bela de um objeto, que é somente a forma da exposição de um conceito pela qual este é universalmente comunicado. (2018, p. 210)”
O gosto é, contudo, tão somente uma faculdade de julgamento, não uma faculdade produtiva; (2018, p. 210)
Em sentido estético, espírito significa o princípio animador na mente. (2018, p. 211)
Agora, eu afirmo que esse princípio não é outra coisa senão // a faculdade de expor ideias estéticas; por ideia estética, porém, entendo uma representação da imaginação que dá muito a pensar sem que, no entanto, um pensamento determinado, isto é, um conceito, possa ser-lhe adequado; uma representação, portanto, que nenhuma linguagem alcança ou pode tornar compreensível. – Vê-se facilmente que ela é a contraparte (pendant) de uma ideia 211 da razão, a qual, inversamente, é um conceito ao qual nenhuma intuição (representação da imaginação) pode ser adequada. (2018, p. 211)
“Pode-se chamar semelhantes representações da imaginação de ideias; em parte porque elas ao menos aspiram por algo que está além dos limites da experiência,” p. 213
Pollyanna Nunes Ramalho Magalhães
Referências
DÖRFLINGER, Bernd. Por que o belo apraz com pretensão de umassentimento universal? As três justificações de Kant e o problema da sua unidade. Tradução Christian Hamm.Universidade de Trier: Alemanha, 2014.
KANT, Immanuel. Crítica da faculdade de julgar. Trad. Fernando Costa Mattos Editora Vozes: Petrópolis, RJ, Editora Universitária: Bragança Paulista, SP, 2018.
SCHILLER, Friedrich. A educação estética do homem: numa série de cartas. Tradução Roberto Schwarz e Márcio Suzuki. Iluminuras: São Paulo, SP, 2002.
________. Fragmentos das Preleções sobre Estética do semestre de inverno de 1792-93. Recolhidos por Christian Friedrich Michaelis. Tradução Ricardo Barbosa. Editora UFMG: Belo Horizonte, 2004.