segunda-feira, 16 de junho de 2025

A senhora que ali estava/ conto

Pela manhã, Ina resolveu conhecer um novo lugar, estava cansada. Não os pais, não o marido, não as pessoas compreendiam. Então por uma semana passou em uma nova cidade e, todos os dias de manhã caminhava por algumas ruas, achava aquele lugar de aparência agradável. Já que estava passando muito mal mesmo, e as pessoas não poderiam imaginar – resolveu caminhar. Viu uma senhora sentada num banco e pensou em conversar com ela para ver se o tempo passava e aqueles sentimentos de tristeza e insatisfação passassem junto. A senhora prontamente lhe deu bom dia e disse que esperava por coincidência que alguém sentasse ali e falasse com ela também. Perguntou seu nome e ambas disseram uma à outra seus respectivos nomes.


O sol pela manhã como de costume naquele lugar estava ameno. Ina percebeu no modo de ser daquela senhora certa avidez para lhe contar algo sobre ela mesma. Achou que deveria perguntar o que ela queria dizer. A senhora lhe disse:

___ A vida é muito difícil, possui nuances de possibilidades e de momentos agradáveis, muito embora a maior parte são momentos complicados.

Então, Ina que não era muito jovem, olhou para aquela senhora e viu seus olhos profundos, esperou com certa obliquidade que ela lhe falasse alguma coisa que fizesse esquecer tantos problemas da própria vida. Aquela senhora lhe perguntou:

__Você espera que eu conte algo de bom e emocionante sobre minha vida? Veja só, olhe bem para mim, você mal me conhece e pelo visto acredita que somente você tem problemas que insiste em esquecer. Não fui uma mulher conhecida, não tive grandes ambições, mas passei por alguns bocados.

A pupila dos olhos de Ina se abriram naquele momento, ali mesmo percebeu que havia algo de importante nas palavras daquela senhora.

_Pois bem, disse a senhora, vou começar a falar algumas coisas, você não me conhece e talvez tudo o que posso te contar sirva somente para que você faça uma reflexão, depois que você acordar pela manhã e depois que você tomar o seu café e depois que estiver bem entediada e você resolver caminhar, bem depois que você sentar aqui e falar comigo. Não tenho dúvidas de que você ficará cansada depois de um certo tempo de conversa, quando a narrativa estiver exaustiva e você dará um desculpa esfarrapada para ir a sua casa e você perceberá que a sua vida não é tão inútil quanto

parece, então você voltará para ter essa conversa de modo que você entenderá que seu modo de comunicar com as pessoas não é tão mal assim, assim você vai a qualquer momento parar de vir até aqui ouvir as peripécias de uma vida cansativa...

__Pode ser, disse Ina, pode ser que isso aconteça, pode ser que não, a senhora não sabe nada sobre mim também. Com toda certeza, algo me diz que a senhora tem algo para contar, e fiquei curiosa.

___ Tem certeza que está decidida em saber algo sobre mim. A minha vida é sem graça, e a memória do ser humano lembra e esquece, é fiel e trai para adquirir coisas novas. E ainda tem aquilo que dizem ser involuntária. Ah, você sabe! Aquilo do bolo, do cheiro que faz lembrar.

___ Nossa, mudando de assunto, deixaram uma poça de água ao lado deste banco, como gostaria de xingar o biltre que fez isso, disse Ina. Poxa, é preciso compreender que pessoas sentam aqui, não podem deixar o lugar nesse estado.

A tarde eclipsou a manhã e quando ambas perceberam aquele dia já havia acabado. A frustração de Ina foi muito grande, uma vez que ela não conseguiu entender nada sobre aquela senhora e ela sabia que teria que voltar no outro dia para saber mais sobre. Começou a ter certa curiosidade sobre quem era, onde morava, porque ela parecia tão sábia e de algum modo trazia uma sagacidade no olhar. Quem era aquela senhora? Com quem ela vivia? O que poderia representar? Talvez nada, talvez a vida, talvez a morte.

No outro dia, pela manhã parecia o mesmo dia, Ina não estava bem, não queria falar sobre isso, estava cansada de falar, falar sozinha. Precisava ouvir algumas coisas que não fosse a própria voz. Sabia que naquele momento estava um tanto só no mundo. E que não aguentava mais o joguete com cores, com roupas, com a vida e a saúde dela. E a vida na atualidade tinha de tudo isso nas redes e queria não ser achada, mas inevitavelmente tinha sido achada, e isso poderia ser um motivo de perda. E estava vivendo as querelas do mundo. Com tantas coisas não resolvidas, como se fosse um algo sem fim. Se desconectou por um tempo e após a caminhada que pelo visto se tornaria algo cotidiano, sentou-se novamente no banco. A senhora não estava lá, então esperou e esperou.... E refletiu como a espera é algo horrível. Será o tempo de dentro o mesmo de fora? Pensou.

E ainda olhou para o céu, refletiu sobre a espera do que se sabe que não vem, então por que se olha tanto o céu? Se nada acontece. Lembrou de algumas aulas iniciais que teve com Herr Wald quando aprendeu os dias da semana Montag, Dienstag, Mittwoch, Donnerstag, e lembrou ainda que a sexta-feira/Freitag sempre era o pior dia da semana. Esperava ter a própria vida de volta. E as palavras, as frases e o todo – essas leituras descontínuas da vida: um documento, uma música, uma placa, um outdoor, uma imagem, um sinal, um livro, um ponto, uma letra, nada disso, nenhum texto poderia urdir a vida e fazer com que ela se sentisse bem naquele momento. Talvez apenas as pessoas. Passou dez, vinte minutos e a senhora chegou. Franzina e se sentou ao lado de Ina. Com o mesmo olhar profundo do dia anterior. Ela observou Ina e parecia querer perguntar se estava tudo bem, não perguntou sobre, talvez para não criar um mal-estar. Começou a tagarelar umas frases. Depois a senhora contou a Ina sobre a sua infância, disse que a mãe sempre dizia que era preciso estudar, que não a havia colocado no mundo para outra coisa que não fosse ter uma boa educação. Com Ina parecia ser um pouco diferente...não quis comentar. Aquela senhora passou horas falando sobre os namorados que teve na vida, que foram poucos, mas o suficiente para entender que alguns homens são importantes e necessários enquanto outros é bom manter uma distância. Ela contou que alguns inspiravam confiança, respeito com as mulheres e que outros são medrosos e não respeitavam muito. A senhora disse que apesar de tudo, teve bons namorados. E que nem sempre concordava com as ideias do marido que eram bem diferentes. Dizia que alguns homens com seus vinte e cinco aparentavam nada demais, quando chegavam aos seus cinquenta eram como o vinho melhores ficavam. Outros, eram o contrário, aos trinta já conseguiam arrasar corações. E isso acontecia também com as mulheres. Ina lembrou que ouviu uma vez dizer para se “aproveitar o dia” antes que não pudesse mais, e ficou chateada com esta frase tão conhecida, pois sabia que o tempo para ela passava também - talvez rápido demais e que nunca soube vivenciar o seu “dia”. Aquela senhora falou sobre tantos assuntos naquela manhã que o tempo passou tão rápido quanto um sopro. Depois Ina foi para casa tão leve como se fosse o próprio vento. Ela se sentia o vento, passando por em torno de todas as casas que ali estavam. Ela era o próprio vento, como se pudesse entrar na respiração das pessoas, era um sopro. Foi assim que se sentiu.

No fim da tarde, Ina foi para casa e à noite foi dormir. Tinha muitas dores. Porém, não queria pensar nisso. Estava simplesmente matutando sobre as palavras daquela senhora. Dormiu com essa ideia...

No terceiro dia, ao acordar, fez o mesmo dos outros dois dias: caminhou e logo de longe avistou a senhora sentada naquele banco. Achou, mínimo bom, não ter que esperar sozinha por ela para continuar aquela conversa dos dois últimos dias. Desta vez, foi Ina que puxou o assunto. Perguntou àquela senhora, de onde ela era. Foi então que ela disse:

__Pode ser que chegue algum dia que eu lhe direi, talvez você não deva saber, pois venho de um lugar distante. Em algum momento saberá! A senhora começou a comentar sobre o que gostava de comer pela manhã. Disse que comia algumas baguetes, alguns pães doces. E que gostava muito de um café. Gostava muito de uma broa, principalmente as que tinham leves pedaços de queijo no recheio. Ina teve que concordar com ela que realmente aqueles alimentos eram bem saborosos. E de fato quem é que não gosta de um bolo ou de uma broa. Pensou também, naquele instante, sobre alguns amigos e amigas que ela tem todo apreço e afeição. Foi assim que veio na memória o passado e o presente. Ao retomar seus assuntos, a senhora falou sobre as rodas de amigos e amigas que tinha. Disse que durante uma semana passou uma tarde falando, com um amigo, sob o pé de uma montanha, das diferenças do cantar dos pássaros ao cume de uma montanha. Ina ficou incomodada, pois apesar de dizer tantas coisas, aquela senhora não explicava muito bem nada sobre si. Acenou-lhe e foi para casa – naquele dia mais cedo.

Ina refletiu sobre o quanto estava cansada, uma vez que aqueles diálogos pareciam não chegar a lugar algum, e estava preocupada. Queria sua vida de volta, rever seus familiares. Tantas pessoas que conhecera também no tempo de estudo. Ficou uma dúvida, voltar para sua cidade ou entender por alguns dias aquela senhora. Em casa, abriu um livro havia, um poema de uma escritora...

Adormeceu com essa ideia e ao acordar pela manhã, não tinha ânimo para caminhar. Apesar disso, não quis imaginar àquela senhora, naquele banco a sua espera. Quis ir em direção ao local que se sentavam para conversar. Olhou para os lados e ao atravessar a rua, a senhora lhe acenou. Ina sentou-se ao seu lado e novamente falaram por toda a tarde…

No outro dia, Ina que não se sentia bem para ir conversar como fazia matutinamente, achou que seria melhor ficar em casa e pensar se voltaria a sua cidade. Então Ina só foi no outro dia caminhar e procurar aquela senhora para se despedir e dizer a ela que estava indo procurar seus familiares.

Foi aí que aconteceu algo estranho, aquela senhora não estava lá, havia um senhor varrendo a calçada. Ina perguntou sobre, se havia visto uma senhora franzina, de aparência agradável ali sentada. O senhor disse que havia uma história sobre uma senhora que falava com as pessoas naquele banco, mas que ela já havia morrido. Muitos moradores diziam que ela aparecia e depois de alguns dias não retornava mais. Ina que ficou estarrecida sem compreender nada resolveu ir embora daquela cidade e voltar para sua vida. Na sua casa, ao abrir a janela Ina se deparou com um vento e uma voz parecia dizer:

Sou o vento, ventaneio por todas os lares

sou o vento que vago voando vacilante vociferante

vento que inspira respira expira

ventaneio, sou movimento volante volátil

sou um vento basculante

sou um sopro restante

sou um vento que se esvai e vai...

Um arrepio passou pelos braços de Ina e ela se lembrou das conversas que teve com aquela senhora e como na sua compreensão ela parecia mais viva em seus diálogos do que os próprios vivos.


o que é Literatura

Por muito tempo da antiguidade, passando pelo renascimento ao período romântico, com a leitura e a releitura de Platão e Aristóteles a arte poética fora entendida enquanto mimesis. Noção que foi se modificando como mostra a história literária. M. H. Abrams, por exemplo, explica que a teoria pragmática (ênfase no efeito produzido por uma obra de arte poética) e com a teoria expressiva (ênfase na subjetividade do poeta), começou-se a dar ênfase na percepção do mesmo. Já a teoria objetiva focalizava a arte poética enquanto “arte pela arte”, a saber, o texto em si mesmo. No contexto, pós críticas kantianas e junto a ascensão da burguesia no século XVIII e, por conseguinte, a do Romance, a Literatura passou a ser compreendida como área de estudos própria mais do que pela via filológica, mais do que produção de textos escritos e impressos, a arte poética mais do que mera emulação do mundo. Além de pensar no sentido de Literatura como letra, nota-se a história literária que se começou a institucionalizar um campo de estudos próprio.

Do Biografismo, ao formalismo russo, ao new criticism (close reading), ao estruturalismo, ao pós-estruturalismo, à estética da recepção passou-se a ênfase do autor, ao texto, ao leitor. A partir da história literária, no que concerne a definição de um texto literário ou sua diferença em relação a outros campos de conhecimento, sua definição pode ser compreendida por meio da “função poética” (Jakobson), sua literariedade”, o nível de ficcionalização, imaginação, seu valor conotativo (Wellek) e as figuras de linguagem que se apresentam. Neste sentido, um texto literário pode ser lido nestes três níveis, a considerar o autor, o leitor e talvez o mais importante o texto, o que significa se questionar quem escreveu um texto e em qual contexto, qual a recepção de uma obra literária, qual o horizonte de expectativa “deste leitor” e qual a estrutura, o que um dado texto tem de literário, sua ficcionalidade enquanto um construto de linguagem.De acordo com Antoine Compagnon não são todos os textos que podem ser considerados Literatura, pois como afirma: 

“Tudo o que se pode dizer de um texto literário não pertence, pois, ao estudo literário. O contexto pertinente para o estudo literário de um texto literário não é o contexto de origem desse texto, mas a sociedade que faz dele um uso literário.” (p. 45). Compagnon, comenta que ainda que boa parte dos estudos teóricos Literários com o ponto de vista do estruturalismo e new criticism tenha se fixado ao texto e rejeitado a relação entre Literatura e Mundo, o autor mostra como a Literatura também
possui referencialidade. Na sua leitura, “o crítico está diante do livro como o escritor está diante do mundo, mas o escritor nunca está diante do mundo; há sempre o livro entre ele e o mundo.” (p. 137) No nexo entre Literatura e mundo, Compagnon comenta “Na realidade, o conteúdo, o fundo, o real nunca foram totalmente alijados da teoria literária.” (p. 138). Já o nexo entre autor e a Literatura ele comenta:

Quando alguém escreve um texto, tem certamente a intenção de
exprimir alguma coisa, quer dizer alguma coisa através das palavras
que escreve. Mas a relação entre uma sequência de palavras
escritas e aquilo que o autor queria dizer através dessa sequência
de palavras nada assegura em relação ao sentido de uma obra e
àquilo que o autor queria exprimir através dela. (p.80)

Ezra Pound nota que Literatura é “[...] Linguagem carregada de significado” (p.32) e acrescenta “Literatura é novidade que permanece novidade” (p. 33). Nessa direção, a literatura ainda que se refere ao mundo é construto de linguagem em que se seleciona se combina signos linguísticos. Numa leitura diferente, Bernard Mouralis comenta que a literatura é uma instituição, um corpus e um sistema em que se constrói um todo significante. Não é uma ideologia em si é um dado signo de sistema e referências, uma herança de legitimação literária. Compagnon também mostra que por muito tempo a literatura era ensinada como história literária e que em meados do século XVIII tornou-se aos poucos se instituiu uma disciplina de Estudos Literários nas universidades.

o lero lero que ouvi

Estava pensando como escrever um conto. Só que há um problema, não gosto de falar de mim, o que parece inevitável muitas vezes. Então teria que inventar uma estória. Ouvi dizer que quem conta um conto aumenta um ponto. Difícil criar uma estória. Não queria falar sobre mim, está que narra. A narrativa é um (entre)mesclar de palavras, frases e como dizer tudo com palavras doces, se a maior parte dos que convive entre nós: aqueles, que você o leitor bem conhece, não têm uma língua tão amistosa. O escritor não parece escrever para agradar, ao que parece escreve por escrever. Na verdade, não sei, vai de sua língua, de seu pesar. O agradável está nos sentidos de quem lê e não nas  mãos de quem escreve. Vou dizer por mim, quando leio uma estória, às vezes fecho os olhos e abro de novo e penso na grandiosidade da simplicidade de palavras de alguns escritores. Já ouvi muito lero lero. E reparo muito, não sei o motivo, mas reparo nas palavras. Será que estou em boas mãos, às vezes me pergunto? Há aquelas pessoas que conseguem ver um todo, no sentido da frase e de uma amplitude no conjunto de palavras e frases - só que eu não consigo, sempre olho as palavras. Quando, não sei uma palavra, então aquilo me deixa reflexionante. Fiquei pensando neste lero lero... que ouvi. E gostei de ouvir ... dizer lero lero, porque ele disse na sua simplicidade. Um conto, uma estória é quase um lero lero, no sentido da letra. Todo mundo sempre quer escrever e ser como muitos dos grandes autores. Algo difícil porque são imbatíveis e com toda certeza sobre o que estou falando tem algo de lero lero… O lero lero é para distrair é para esquecer um pouco o que não se quer lembrar. É para dizer de modo sútil, não gosto disso. Só que, queria mesmo era que o tempo voltasse, a sucessão de acontecimentos. Parece estranho dizer isso: porque o tempo não volta. Sempre achei que não, eu acho que não. Queria que voltasse apenas há cinco anos ou sete anos. Só que o tempo não volta... E não sei falar sobre o tempo. O tempo é algo difícil e quando a chuva cai nunca sei se é bom, também nuca sei se a lua grande e brilhante na janela é bom. Hoje, é dia de sol ao menos aqui onde estou. O sol é tudo. Só que o sol é muito sublime. A chuva também é sublime, o rio e o mar, o vento – só que o sol é imbatível. O sol aquece e queima. O sol ilumina e ofusca. Do sol é preciso se proteger. Ele nos dá vida, mas há certa distância necessária. Tudo o que sei é que o sol é importante. O lero lero é um modo de proteger àqueles que amamos. Vou encher este texto de lero lero, de palavras soltas para não deixar e não colocar nada do que é importante para mim visível. É um modo de figuração, o que na poesia acho mais próximo. A figuração, a transfiguração é o caminho – de dizer – sem dizer, o que você sabe. Por isso, estou aqui me esforçando para dizer isso a você que sabe ou que deveria saber que as palavras que mais me envolvem são as simbólicas. E que está difícil explicar a apenas quem precisa saber. Li um poema e minha dúvida permanece: O poema chama “Reencontro com a amada” é de um escritor a outro alguém. E o verso fica em meu pensamento “Mas não o já velado, revelado demais que desencantou”. E a minha dúvida de leitora assídua, há anos, permanece. E outro verso “Mas a nudez nem existe.”. "O pio do quero-quero" e amizade, será que existe? "saya’su, acauã". E o que fica. E o que é importante. São muitas dúvidas.

De Pollyanna Nunes Ramalho

 

Em Harry Potter: e a pedra filosofal, livro de J.K. Rowling (tradução de Lia Wyler), tem-se a história do menino Harry Potter que fala sobre o valor da amizade dentre outros temas. A narrativa se torna uma leitura fluída e acessível, apesar da grande quantidade de personagens e histórias, sendo o primeiro romance dentre outros como Harry Potter a Câmara secreta, Harry Potter e o prisioneiro de Azkaban, Harry Potter e o Cálice de fogo, Harry Potter e a ordem da fênix, Harry Potter e o enigma do príncipe, Harry Potter e as relíquias da morte. Em tais romances há o desenvolvimento do personagem até juventude, seria assim um Bildungsroman, em que se tem o desenvolvimento, a educação, a mudança de um personagem ao longo da narrativa.

No primeiro romance, nos capítulos iniciais, vê-se os primeiros personagens como os Dursley, a prof. Minerva, Dumbledore e o leitor começa por compreender aos poucos quem são os personagens. A narrativa inicialmente faz uma digressão: uma conversa entre Dumbledore e Hagrid que falam sobre a morte dos Potter, sobre Voldemort e sobre o bebê na casa dos Dusley: o menino que sobreviveu. Então o leitor começa por entender um pouco a narrativa. No segundo capítulo, passam-se 10 anos, este cresce e o romance começa a descrever o dia-a-dia do menino Harry Potter e suas características, lugar onde vive com os tios Dusley (Valter, Petúnia e o primo Duda). Harry Potter, um menino de óculos remendados, olhos verdes, cabelos muito pretos que anda com uma coruja é o protagonista do romance. Começa a chegar na casa dos tios cartas e muitas cartas que os tios não deixam Potter ler e o leitor se depara com a expressão “trouxas”. Harry não sabe o motivo pelo qual se sente deslocado. O tio com a chegada de tantas cartas decidem viajar para um casebre, evitando assim que o menino leia as cartas. Mas, ao chegar no casebre, alguém bate na porta, é Hagrid, guadião das chaves e das terras de Hogwarts que então entrega a carta a Potter e pergunta a ele: “Você nunca se perguntou onde foi que seus pais aprenderam tudo? Tudo o quê? Pergunta Harry.” Após ler a carta Harry descobre que foi convidado a estudar em Hogwarts, uma escola de bruxos e os tios trouxas (na linguagem do romance são aqueles que não são bruxos), assim começa a saga de Potter.

Rúbeo Hagrid decidi comprar o material de Potter para que ele estude em Hogwarts, assim aparece os outros personagens do Romance. Harry descobre que os pais dele eram muito conhecidos em Hogwarts e que estes deixaram a ele possibilidades de estudar na escola de magia. Com isso, ele adquire a vassoura para o quadribol, sua varinha mágica feita de pena de fênix e os livros, preparando-se para estudar em Hogwarts. A partir daí e após o embarque na plataforma nove e meia, Harry conhece Rony Weasley e na cabine do trem para Hogwarts Hermione Grager que se tornaram os grandes amigos de Potter. Assim, ele conhece Draco Malfoy um menino que Potter não gosta muito no primeiro livro.

Quando chegam em Hogwarts há uma cena do chapéu seletor, um chapéu de bruxo, chapéu antigo que escolhe a partir de cada grupo ou casa, onde cada aluno ficará. “Ana Abbott fica na Lufa Lufa, Susana Bones também na Lufa Lufa, Teo Boot Corvinal, Hermione Grager Grifinória, Rony Grifinória, Malfoy Sonserina e quando chega o momento de Potter o chapéu fica na dúvida – diz que este se daria bem na Sonserina, mas fica na Grifinória.


Ah, vocês podem me achar pouco atraente

Mas não me julgam só pela aparência

Engulo a mim mesmo se puderem encontrar

Um chapéu mais inteligente do que o papai aqui.

Podem guardar seus chapéus-cocos bem pretos,

suas cartolas altas de cetim brilhoso

Porque sou o chapéu seletor de Hogwarts

E dou de dez a zero em qualquer outro chapéu

Não há nada escondido em suas cabeça

Que o chapéu seletor não consiga ver,

Por isso é só me porém na cabeça que vou dizer

Em que casa de Hogwarts deverão ficar

Quem sabe sua morada é Grifinória

Casa onde habita os corações indômitos

Ousadia e sague-frio e nobreza

Destacam os alunos da Grifinória dos demais;

Quem sabe é na Lufa-Lufa que você vai morar;

onde seus moradores são justos e leais

Pacientes e sinceros, sem medo da dor;

Ou será a velha e sábia Corvinal

A casa dos que tem a mente sempre em alerta,

onde os homens de grande espírito e saber

Sempre encontrarão companheiros seus iguais;

ou quem sabe a Sonserina será a sua casa

E ali fará seus verdadeiros amigos,

homens de astúcia que usam quaisquer meios

Para atingir seus fins que antes o colimaram.

Vamos, me experimentam! Não devem temer!

Nem se atrapalhar! Estarão em boas mãos!

(Mesmo que os chapéus não tenham pés nem mãos)

Porque sou único, sou um Chapéu Pensador)” (p. 105)



Cada uma das casas tem um símbolo: Grifinória um leão, Lufa Lufa a fênix, Sonserina a serpente e a Corvinal. Potter a partir de então conhece seus professores Minerva, Quirrell, Snape, Dumbledore o diretor de Hogwarts são os professores que estão no primeiro livro. Para o jogo de quadribol, Harry ganha a vassoura Nimbus 2000, aprendem a fazer transfiguração, feitiços entre outras. Potter ganha uma capa de invisibilidade que era de seu pai e assim ele anda por Hogwarts sem ser visto.

Quirrel, no começo do romance, é um professor que leciona Defesa de arte das Trevas, no entanto, Potter, Hermione e Rony percebem que alguém tem interesse em pegar a pedra filosofal (na história do romance, esta foi produzida por alguns alquimistas como Nicolau Flamel.) No livro, Potter encontra um espelho no qual ele vê a imagem dos pais. Dumbledore diz a Potter que o espelho não nos dá nem conhecimento, nem a verdade e ainda diz “Não faz bem viver sonhando e se esquecer de viver, lembre-se.” Os jovens descobrem que um cachorro muito grande fofo guarda a pedra filosofal em Hogwarts e decidem destruí-la para que não estivesse em mão erradas, com isso, descobrem que ao tocar uma música fofo adormeceria e passam por várias provas como o jogo de xadrez. Potter, Hermione e Rony pensavam que fosse o professor Snape que queria pegar a pedra filosofal e imaginaram que fosse ele quem jogou o feitiço contra Potter no jogo de Quadribol, mas, no final Romance, o leitor descobre que quem tinha o interesse, seria o professor Quirrell que estava tomado por Voldemort, com isso Potter com a pedra filosofal coloca-a no espelho, para que Quirrell não consiga pegá-la, salvando assim a todos. Com a revelação de Quirrell, este diz a Potter que Snape nunca gostara de seu pai. Ao procurar atingir Potter, Quirrell não consegue atingi-lo, uma vez que este está sobre proteção do amor de sua mãe. Ao acordar Dumbledore diz que a pedra filosofal foi destruída. No final do primeiro Romance, Potter descobre que Snape não gostava de seu pai, mas se sentia em dívida com ele, porque este o salvara. O romance termina com Potter recebendo um livro encadernado com as fotos de seus pais.


Resenha de Pollyanna Nunes Ramalho 

Sobre o romance "Perto do coração selvagem"

 Perto do coração selvagem [1944] é “o romance de estreia”, da escritora Clarice Lispector que em torno de seus quase vinte anos é em vida e mais tarde considerada uma das escritoras mais importantes da literatura. Lispector chegou ao Brasil muito cedo, morou em Recife, depois no Rio de Janeiro, estudou e foi casada com um diplomata brasileiro, ao que a possibilitou muitas idas ao exterior Suíça, Itália entre outros lugares, teve dois filhos, escreveu vários romances e contos – escrevera a convite de jornais, era de personalidade introspectiva, à frente de sua época, ao mesmo modo que muitas escritoras brasileiras tais como Lygia Fagundes Telles, Hilda Hilst, entre outras muito importantes.

 

Em seus contos, novelas e romances é notável uma linguagem irreverente ao modo de James Joyce, Virgínia Woolf, o fluxo de consciência [the stream of consciousness] de seus personagens. O texto de Clarice Lispector não se prende a gêneros bem definidos, escritora de contos, novelas que estão entre o romance e o conto: apresenta uma prosa poética.

A escritora consegue exatamente mostrar o que as personagens pensam, sendo mulheres ou homens. O leitor se pergunta quais as referências de leitura da autora. Em Perto do coração selvagem, a epígrafe inicial mostra sua linguagem hermética, cita o escritor muito conhecido Irlandês James Joyce que diz “Ele estava só. Estava abandonado, feliz perto do selvagem coraçãoda vida”, epígrafe que remete ao título de seu livro e ao fluxo de pensamento das personagens, com isso, durante a leitura os leitores se deparam com a corporeidade dos mesmos e com leituras e percepções diluídas de Spinoza e da música “estudo cromático de Bach”. Apesar de introspectiva, seu estilo de linguagem é muitas vezes irreverente, desconcertante suas narrativas se confundem com as experiências da autora, por isso, muitos notam, como “autobiografias não planejadas”, a estranheza. Falava de si ou não? Havia o que ela mesma nota, “transfiguração”. Seria o texto de Clarice a transfiguração da matéria bruta? “[…] nada existe que escape à transfiguração” (p. 180). Seria a autora Lídia, Joana ou Otávio? O leitor não consegue e não tem como saber.


A autora depura os acontecimentos de sua vida, diluída em símbolos. Sua narrativa se constrói tal como a engenhosidade da poesia. “Muita coisa não posso te contar. Não vou ser autobiográfica. Quero ser ‘bio’” (Água viva, 1973, p.40). E bio é vida.


Se em Perto do coração Selvagem a “eternidade” para sua personagem não é mensurável, sequer divisível, assim não por quantidade, e sim por qualidade, sendo sucessão, talvez duração, ao que parece mostrar certa finitude do corpo e as relações do passado e do presente e futuro dos personagens. Onde estaria a eternidade? Descreve uma de suas personagens“[…] talvez num fim de uma tarde, num instante de amor […] (p. 193). Já no romance Água viva, por exemplo, uma prosa poética, “o instante é somente vida”. “E quero capturar o presente que pela sua própria natureza me é interdito: o presente me foge, a atualidade me escapa, a atualidade sou eu sempre no já.” (p. 8). A imagem do professor, a esposa algo que desconcerta, certo desarranjo tão diferente da imagem poética no romance posterior de Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres.


Os pensamentos, os fluxos de pensamento de “Otávio” entre Lídia e Joana fica entre seu sentimento de amor e desprezo, responsabilidade com a vinda de um filho, dúvidas e reflexões ao mesmo tempo agudeza do olhar masculino. A incompreensão do feminino e a corporeidade de ambas, sentimentos que voltam em tempo de criança, do passado para presente. “De profundis”. A mulher enquanto mistério. “Nunca penetrei no meu coração” (p. 151). A narrativa que volta da infância para a juventude e retorna, como algo cíclico. A descrição da vinda do filho “Falava das próprias dores e ela embora não ouvisse, não pensasse, não falasse, tinha um olhar bom – brilhante e misterioso como de uma mulher grávida.” (p. 99) Assim a feminilidade de Lídia e Joana eram descritas.


A sublimidade do mar, mar que parece personificado “o mar era muito”. E a incompreensão da palavra “nunca”, sequer masculino ou feminino. A epifania de suas personagens. O mistério do dicionário como achar o “i” depois do “l”, assim como retornar? A palavra Lalande que ao estranho explica: “Lalande é também mar de madrugada, quando nenhum olhar ainda viu a praia […]”. São símbolos diversos que se apresentam em seu livro de estreia que figuram em seus livros posteriores: o relógio: “tac-tac-tac… O relógio acordou em tin-dlen sem poeira”/ “Vazio como a distância de um minuto a outro no círculo do relógio”/ “sob a luz enfraquecida pelas franjas sujas do lustre, também o silêncio se sentara nessa noite”.


Sobre o tempo da narração de Lispector não se dá numa sucessão de acontecimentos lineares, sua narrativa parece cíclica, vem da percepção de suas personagens e da linguagem. Em Perto do coração selvagem não se tem uma narrativa de acontecimentos lineares, às vezes nota-se lacunas em que o leitor retoma em momentos seguintes alguns dos acontecimentos, são analepses e prolepses, uma vez que se tem na narrativa que se inicia por descrições da infância questões do cotidiano depois retorna à juventude, a idade adulta dos mesmos e às vezes retoma acontecimentos do passado. Se mistura o “tempo do narrar” [Erzählzeit] com o “tempo narrado” [erzählte Zeit]. Benedito Nunes nota sobre o eterno na narrativa, na linguagem literária ao que às vezes se assemelha a narrativa de Lispector:


"É deslocável o presente, como deslocáveis são o passado e o futuro “De uma ‘infinita docilidade’, o tempo da ficção liga entre si momentos que o tempo real separa. Também pode inverter a ordem desses momentos ou perturbar a distinção entre eles, de tal maneira que será capaz de dilatá-los indefinitivamente ou de contraí-los num momento único, caso que se transforma no oposto do tempo,
figurando o intemporal e o eterno." (1988, p. 25)


Na narrativa de Clarice Lispector, nota-se o discurso indireto livre, próprio às narrativas modernas, a discursividade de sua narrativa coaduna o que se teria em separado o discurso direto da narrativa: quando se tem a fala direta das personagens, do discurso indireto quando o narrador por elas falam. Lispector mistura as falas das personagens (discurso direto) com seus pensamentos, fluxo de consciência em primeira pessoa e às vezes em terceira pessoa. É como se a autora abrisse o pensamento das personagens ao leitor. Cada um descrevendo as impressões da vida em primeira pessoa. O que a autora faz conforme comenta Benedito Nunes fundi o tempo da história ao da ficção com a da escrita.


REFERÊNCIAS


GOTLIB, Nádia Batela. Teoria do conto, São Paulo, ática, 1997.

LISPECTOR, Clarice. Perto do coração Selvagem. Rio de Janeiro: Rocco, [1944] 1998.

NUNES, Benedito. O tempo na narrativa. editora ática, 1988.